
O Dia dos Povos Indígenas, celebrado em 19 de abril, é uma data importante para refletir sobre a valorização dos saberes indígenas e o respeito aos seus direitos, incluindo o direito à alimentação escolar adaptada a seus hábitos e costumes. Dentro das comunidades indígenas, a escola é o lugar onde se busca preservar a língua, a cultura e as tradições. Porém, ainda existem desafios quando se trata da alimentação escolar adaptada às comunidades.
O Centro de Excelência contra a Fome conversou com lideranças indígenas durante Acampamento Terra Livre, a maior assembleia dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil, que acontece desde 2004, no mês de abril em Brasília. Em comum, as lideranças alertam que a alimentação fornecida nas escolas indígenas, na maior parte das vezes, não respeita as especificidades culturais e alimentares de cada povo.
“A questão da alimentação escolar indígena é muito complexa. Nos territórios, as crianças se alimentam de forma natural, com alimentos naturais. Mas as escolas recebem enlatados e embutidos e coisas que não fazem parte do dia a dia da criança indígena. Esse é o grande questionamento de todas as lideranças das organizações”, afirmou Gracinha Manchineri, especialista em Antropologia Indígena e diretora pedagógica do Centro Amazônico de Formação Indígena (Cafi) da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
Segundo ela, existem algumas iniciativas de programas do governo federal, que buscam comprar diretamente no território o alimento que será servido para os alunos. “Porém, ainda é uma iniciativa muito incipiente para a realidade dos povos indígenas na atualidade”, afirma.
Wauana Manchineri, analista de projetos e programas do Cafi, explica que o processo de compra local de indígenas é muito burocratizado, mesmo tendo um Programa Nacional de Aquisição de Alimentos que determina que ao menos 30% dos alimentos sejam comprados da comunidade.
“A gente acaba esbarrando em alguns processos para poder fazer essa aquisição. Eu faço parte do Comitê Consultivo do programa. E lá, a gente ouve muitas realidades dizendo que é uma comida que não é segura para as crianças, sendo que elas comem essa comida no dia a dia, e é a comida mais natural possível”, disse.
Variedade
Outra questão a ser levada em consideração é que os hábitos alimentares variam muito, de acordo com as etnias e regiões dos povos. Concita Sõpré, presidente da Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará e diretora da Escola da Tatakti Kyikatêjê (da etnia Gavião Kyikatêjê), descreve alguns alimentos mais comuns que deveriam entrar no cardápio da alimentação escolar indígena.
“A gente tem macaxeira ou mandioca, batata doce, amendoim, açaí, castanha do Pará, a gente tem o peixe e nós também temos os nossos animais silvestres, que também fazem parte da cadeia alimentar do nosso povo”. Outros exemplos de alimentos, são as sementes, a banana e o milho, e carne de caça, como capivara e jabuti, que algumas etnias comem, outras, não.
Para ela, é necessário mais diálogo para que a alimentação escolar seja adaptada aos indígenas. “O problema é que o governo faz um projeto de alimentação para as comunidades indígenas, mas não convida os povos indígenas pra dar sugestão”, argumenta.
A importância desse diálogo é fundamental para garantir hábitos que trazem saúde para as crianças das escolas indígenas. Rose Apurinã, vice-diretora do Fundo Indígena da Amazônia Brasileira, esclarece que a alimentação tradicional de cada povo tem um significado. “Alimento tem a ver com a força de cada povo. E tem a ver com a preparação das crianças para a vida adulta, para dar continuidade aos modos tradicionais de vida e de garantia de saúde”, afirmou.