Nesta quarta-feira, 22 de junho, especialistas do Centro de Excelência contra a Fome do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas (WFP) no Brasil, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), do UNICEF e do Pacto Global da ONU fizeram parte do painel “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Segurança Alimentar”, como parte do Encontro Nacional Contra a Fome. O Encontro é organizado pela ONG Ação da Cidadania e por diversas entidades que atuam na temática da segurança alimentar e debate saídas e soluções para frear o avanço da fome no Brasil.
Durante o painel, os especialistas focaram no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 2, que busca acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhor nutrição e promover a agricultura sustentável; e no ODS 17, de fortalecimento dos meios de implementação e revitalização da parceria global para o desenvolvimento sustentável.
Daniel Balaban, Diretor do Centro de Excelência contra a Fome do WFP no Brasil, iniciou as apresentações detalhando o trabalho do WFP no mundo e as ações específicas do Centro no Brasil. Ele destacou que, no mundo, o WFP atende diversas pessoas em situações de conflito, crises climáticas adversas, entre outras situações que impulsionam a fome. “Infelizmente, o trabalho não é o suficiente. Atendemos cerca de 130 milhões de pessoas, mas nós temos mais de 800 milhões de pessoas passando fome agora ao redor do planeta”, destacou Daniel Balaban.
Outro fator levantado pelo Diretor como agravante da fome no planeta foram as guerras e conflitos armados, que, de acordo com o Instituto Estocolmo para a Paz Mundial (SIPRI), consumiram 2,2% do PIB mundial em 2021, o que representa aproximadamente US$2 trilhões. O valor equivale a cerca de 40 vezes o orçamento anual do WFP para levar assistência alimentar a mais de 120 países. Para o Diretor, acabar com a pobreza e a fome no mundo requer investimentos em sistemas alimentares bem organizados e a criação de programas de alimentação escolar amplos. “É possível fazer da fome um capítulo do passado”, disse.
De acordo com o representante da FAO no Brasil, Rafael Zavala, o conflito armado traz diversas consequências negativas para o combate à fome no mundo e representa a causa de insegurança alimentar para 139,1 milhões de pessoas. A guerra envolvendo Ucrânia e Rússia, por exemplo, trouxe uma distorção logística e um aumento do preço da energia, do gás, do petróleo e dos fertilizantes, uma vez que a Ucrânia, Rússia e Bielorrússia produzem cerca de 40% dos fertilizantes utilizados no mundo. “O conflito armado da Rússia contra Ucrânia não é somente um conflito armado, é um conflito armado entre duas potências da agricultura”, destacou.
De acordo com a FAO, entre 2016 e 2021, a população em crise teve um aumento de cerca de 80% no mundo, passando de 108 milhões de pessoas para 193 milhões. Segundo Rafael Zavala, a conjunção de quatro causas leva ao crescimento da insegurança alimentar e da fome no mundo: o conflito armado, a crise econômica, a crise climática e a crise sanitária. Para ele, assim como para Daniel Balaban, o enfrentamento desse cenário passa por repensar os sistemas alimentares, mudar paradigmas e garantir a continuidade de programas de alimentação escolar, como o PNAE, o programa de alimentação escolar do Brasil.
O novo sistema alimentar deve ser integral e focar, principalmente, em nutrição por unidade de insumos e recursos, onde os protagonistas são os consumidores e a sociedade civil. Também é importante que nesses novos sistemas as economias emergentes desempenhem um papel cada vez mais importante e que as questões de gênero estejam no centro do planejamento e da execução.
No mesmo painel, Luciana Phebo, coordenadora do Território Sudeste e chefe do escritório do Rio de Janeiro do UNICEF, trouxe uma palestra sobre a importância da alimentação adequada na primeira infância. “Um dos caminhos, talvez um dos caminhos mais estratégicos [para acabar com a fome no mundo], é apostar na primeira infância”, afirmou.
Em 2021, a organização fez um estudo intitulado “Alimentação na Primeira Infância”, para o qual foram realizadas entrevistas com 1.343 cuidadores de 1.647 crianças menores de 6 anos, apoiadas pelo Bolsa Família em 21 estados brasileiros. A pesquisa revelou que 80% das crianças consumiram ultraprocessados no dia anterior à pesquisa e 72% dos cuidadores afirmaram que alguma criança deixou de fazer alguma refeição. Os alimentos ultraprocessados mais consumidos foram biscoitos e bebidas açucaradas. De acordo Luciana, “existe um deserto alimentar próximo às casas e aos domicílios das famílias mais vulneráveis, não só nos centros urbanos, mas também em zonas rurais, nas populações indígenas, ribeirinhas, quilombolas”.
Já Tayná Leite, Gerente Sênior de Direitos Humanos e Gênero do Pacto Global da ONU no Brasil, destacou o papel das empresas na implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela Agenda 2030. “Não há outro negócio mais valioso do que a sustentabilidade do nosso planeta e a vida digna daqueles que aqui habitam”, afirmou a gerente.
Ela também considera fundamentais a diversidade e a inclusão nesse processo, para conseguir soluções mais efetivas para problemas atuais, já vistas em algumas comunidades indígenas, tradicionais e quilombolas. “A diversidade e a inclusão são essenciais para que possamos ter vozes diferentes nos trazendo essas perspectivas e soluções novas para problemas antigos”, finalizou.
O painel completo está disponível no canal do YouTube da Ação da Cidadania.